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SINCRONICIDADE

Projeto do Instituto de Física da Fapesp que estuda a sincronização e a plasticidade de sistemas neurais

*Sincronicidade: [...] A sincronicidade, segundo Carl Jung, transcende a coincidência casual. Jung introduziu o conceito de sincronicidade como uma interconexão significativa entre eventos externos e estados internos da psique, sem relação causal aparente. Essa teoria desafia a visão convencional de causalidade, sugerindo que alguns eventos não estão apenas conectados linearmente, mas também simbolicamente.

 Para Jung, a sincronicidade revela a presença de um princípio ordenador no universo, onde eventos externos e experiências subjetivas coexistem em uma dança significativa. Essa dança não é regida apenas pelas leis da física, mas também por uma ordem psíquica subjacente. [...] 

Fonte:https://www.posuscs.com.br/o-que-e-a-sincronicidade-para-jung-e-qual-a-relacao-com-a-individuacao/noticia/2900

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Há livros que compramos e deixamos quietos na prateleira, esperando, por anos, o momento de puxá-lo aleatoriamente para lê-lo ou consultá-lo.

Hoje, foi o dia em que pus em prática esse costume: bati os olhos num livro novinho em folha cuja compra nem lembro mais quando a fiz. O nome dele: Crença e Resistência A dinâmica da controvérsia intelectual contemporânea, de autoria de Barbara Hernstein Smith, Editora Unesp, 1998.

Comecei pela orelha do livro em que consta:

Aceitar o questionamento de verdades aparentemente absolutas pode ser traumático, mas constitui um autêntico ato de humildade intelectual. Este livro traz justamente o grande ensinamento de saber lidar com outros pensamentos e culturas de uma maneira sempre tolerante, mas crítica. Aquilo que é diferente de nós não poderia ser visto como algo a ser evitado, temido ou proibido, mas sim considerado como oportunidade para reflexão.

A autora discute, ao longo da obra, o conceito e o significado de termos como verdade, conhecimento, significado, razão, objetividade e justificativa. Mostra, assim, como o jogo entre a convicção cega e o ceticismo próprio do pós-modernismo está no centro do debate intelectual contemporâneo.

Acima de tudo, há uma condenação do autoritarismo das ideias e uma defesa irrestrita do direito ao livre pensamento.

A obra, portanto, enfoca cognição, retórica, psicologia e questões sociais e psicológicas, alertando sempre para a importância do equilíbrio entre a crítica ao dogmatismo e a defesa de nossas crenças mais arraigadas.

E onde entra a sincronicidade nessa história?

[Utilizando-me rasamente do conceito junguiano de sincronicidade]

Dois dias atrás, um amigo me enviou um vídeo biográfico de Giordano Bruno (segue link abaixo). Nele, o texto se detém no pensamento desse que desafiou os dogmas da Igreja Católica a qual pertencia como frade dominicano e, por essa razão, acabou condenado à fogueira da Inquisição no dia 17 de fevereiro de 1600.

*link do vídeo:  https://youtu.be/CcGiYHzB488?si=4cUwtV5_lr5S3sua

Ocorre que só fui assistir ao vídeo hoje cedo e, exatamente hoje cedo pus as mãos no livro citado.

Coincidência? Inspiração? Sincronicidade? Não saberia dizer. Nesses momentos, sinto-me confuso e perplexo[1] como o príncipe Hamlet:

 “há mais coisas entre o céu e a terra do que sonha a nossa vã filosofia!”[2]

Difícil? Quem disse que seria fácil?


[1] Na filosofia, a perplexidade, ou "aporias" como é muitas vezes referida, é um estado de dúvida, hesitação ou desconcerto diante de uma questão ou problema que desafia as crenças e valores preexistentes. É o ponto de partida para a reflexão e para a busca de um entendimento mais profundo da realidade. Para o interessado em Filosofia é bom saber, antecipadamente, que conviverá com a perplexidade sempre, pois ela está presente o tempo todo naquele que busca a verdade.

[2] A frase expressa na peça de Shakespeare remete à ideia de que existem forças e realidades além do alcance da compreensão humana ou da filosofia, e que a nossa capacidade de entender o mundo é limitada. 

Comentários

  1. Sua reflexão costura de forma belíssima a ideia de sincronicidade junguiana com a experiência pessoal do acaso significativo, revelando como certos acontecimentos — aparentemente triviais — despertam um sentido mais profundo quando vistos sob a lente simbólica. O encontro entre o vídeo sobre Giordano Bruno e o livro da Barbara Hernstein Smith não parece apenas uma coincidência cronológica, mas uma tessitura de sentido entre a liberdade do pensamento e o desafio às verdades absolutas.
    Giordano Bruno é, em si, um arquétipo do espírito livre que ousa pensar além do permitido, ecoando exatamente o que a autora de Crença e Resistência propõe: lidar criticamente com o diferente, recusando tanto o dogma quanto o ceticismo absoluto. Sua execução pela Inquisição é um lembrete trágico de como a resistência ao autoritarismo das ideias pode custar caro — e, mesmo assim, é necessária.
    A sincronicidade, nesse caso, não se reduz a um capricho do acaso, mas pode ser interpretada como um espelhamento psíquico: seu estado interior — talvez uma disposição para questionar crenças, para abrir-se ao novo — atraiu, em sentido junguiano, esses dois eventos externos. Eles não se ligam por causalidade, mas por afinidade simbólica.
    Essa dança entre mente e mundo, essa justaposição que escapa ao controle racional, é onde Jung via um princípio ordenador mais profundo — talvez o mesmo que Hamlet, perplexo, tenta nomear, mesmo sem compreender.
    E você o percebeu com agudeza: “Difícil? Quem disse que seria fácil?” — pois a consciência não é um dom, mas uma travessia. A sincronicidade, nesse caso, pode ser o vento que sopra velas rumo a essa travessia interior, quando tudo parece estar no tempo certo — mesmo sem sabermos o porquê.

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  2. Lembrei da prática com aromaterapia/aromacologia: as pessoas tendem a gostar de cheiros que lhe são conhecidos. Por isso, os testes olfativos "às cegas" são muito reveladores. O que me leva sempre a pensar que somos mais leais do que livres, presos a padrões e lealdades, muitas vezes, inconscientes.

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  3. Seu texto me fez pensar na sincronicidade como uma espécie de costura invisível entre tempo e sentido, quando o acaso deixa de ser mero acaso e passa a ressoar como mensagem. É como se o universo falasse em linguagem simbólica.

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  4. "Há mais coisas entre o céu e a terra do que sonha nossa vã filosofia"- é um pensamento que me acompanha quando percebo fatos e eventos que acontecem comigo e não consigo entender muito bem. SIncronissidades? Intuições? Avisos do inconsciente? Ótimo texto e reflexão

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