Para falar desse tema, parto de Paul Valéry:
Maus Pensamentos & Outros
Editora Âyné, 2016
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É verdade que a maioria das pessoas busca conforto e segurança na fé que professa – seja ela fé religiosa ou de outra substância.
Quero, entretanto, focar na fé religiosa que, quando séria, redunda numa espiritualidade comprometida, visceral e avessa ao proselitismo e à avalanche de modelos midiáticos das crenças atuais.
Veja lá, não é uma prática tão fácil assim; tampouco é hermética na qual se busca o isolamento em templos e grupos fechados visitados apenas por iniciados. Não.
Ela é, ao mesmo tempo, aberta e sistêmica e tem contato, a meu ver, com todas as áreas da atividade humana. Portanto, uma fé razoavelmente engajada que evita qualquer tipo de extremismo sem, no entanto, flertar com a alienação que caracteriza alguns movimentos dentro da cultura.
Abraça irmãos de fé, assim como convive bem com todas as manifestações sinceras de religiosidade voltadas ao trabalho de pacificação e do acolhimento, bem como aqueles que não professam religião nenhuma.
Outro ponto muito interessante e desafiador dessa espiritualidade é o da busca sincera e constante da verdade; o que significa a presença indispensável da dúvida – que neste caso não se opõe a esse tipo de fé, mas a confirma, a cada momento, os seus postulados, ou, em última análise, as refuta com naturalidade. Aquele que busca tal fé é, essencialmente, alguém que lida bem com o diálogo e com o contraditório.
Suas ferramentas de trabalho são as mãos e o pensamento, sempre ativos e sem segundas intenções. Vive cada dia com intenso interesse pelo imanente, isto é, com a realidade concreta.
É discretíssima e modesta, porém dotada de profundo senso crítico construído na mais honesta busca do saber, sabendo, de antemão, que essa busca não tem fim. Daí o exercício constante da humildade diante da grandeza do desconhecido.
Por
fim, é uma fé que se confunde com o pensamento filosófico e que incomoda muito
(graças a Deus!).
Não custa retornar a Paul Valéry (citado no início): Os verdadeiros problemas dos verdadeiros filósofos são aqueles que atormentam e que tornam a vida incômoda.
Difícil?
Quem disse que seria fácil?
Eis a fé na qual me enquadro, pelos atributos citados na sua reflexão, irmão Humberto.
ResponderExcluirVou de Raul Seixas:
ResponderExcluir"Veja
Não diga que a canção está perdida
Tenha fé em Deus, tenha fé na vida
Tente outra vez"