Algum tempo atrás, uma querida pessoa, leitora deste Blog – a MônicaMaria, fez a seguinte pergunta:
Você acha que o amor pode apresentar movimentos de “retração” e de “expansão”, dependendo dos movimentos da vida?
Cheguei a escrever muitas páginas para responder à questão, mas acabei optando por uma resposta reduzida. Espero que com ela, eu possa ter contribuído para a reflexão deste importante tema.
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No registro dos evangelhos, Jesus solicita que nos amemos uns aos outros como ele havia exemplificado. E mais, diz que todos reconhecerão os seus discípulos ou seguidores pelo amor que têm pelos outros.[1]
A frase é forte, mas justa e clara, porque o ensinamento está baseado não só em palavras, mas em atitudes do Mestre.
Esse amor o qual Jesus se refere é o amor fraterno, desinteressado e libertador. Bem diferente da forma que o vulgo ama.
A maioria de nós,
eu – pessoa comum, ainda não tenho a capacidade de amar dessa forma. Não é uma
questão de escolha. O amor não é uma escolha racional nem temporal: não posso
dizer vou amar aquela pessoa a partir de amanhã, às 7 em ponto da manhã. Seria
uma tolice assim pensar.
Também não podemos cobrar de ninguém que ame, sobretudo se exigimos que tal amor seja direcionado para nós. Outra tolice.
Portanto, por ser um amor pouco conhecido por nós, aquele modo de amar, a que Jesus se refere, traz em si a marca da inalterabilidade. Não se altera, porque se dá no tempo, mas não pertence ao tempo. É atemporal.
E como se consubstancia na fraternidade, no desinteresse e na libertação, ele não oscila nem para mais e nem para menos. Ele é justo. Tomo emprestado a inspiração de Djavan:
Por ser exato
O amor não cabe em si
Por ser encantado
O amor revela-se
Por ser amor
Invade, e fim[2]
(quem
quiser ouvir a canção de Djavan, segue o link:
https://www.youtube.com/watch?v=qUKXNdXhzH0)
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Quer dizer que aquele amor a que Jesus se refere é impossível na Humanidade?
Seria
um contrassenso pensar que o Mestre pedisse aos discípulos e seus seguidores
fazerem determinada coisa sem que fosse possível fazê-la.
O que o Mestre pede não é impossível, mas pouco provável dada a natureza humana que se move por interesses diversos. E isso não é nenhum pecado. É difícil, porque é raro encontrar alguém com essa capacidade de amar.
Talvez, seja por esta razão que Augusto dos Anjos destila pessimismo nos seguintes versos:
Falas de amor, e eu ouço tudo e calo!
O amor da Humanidade é uma mentira.
É. E é por isso que na minha lira
De amores fúteis poucas vezes falo.[3]
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A maneira como as mães amam seus filhos não seria aquele amor solicitado por Jesus? E se for, esse amor não é tão raro assim. Mães as temos aos montes.
Aí reside uma sutileza pouco agradável aos que acham que o amor de mãe é divino. É fácil perceber que o amor materno não é o mesmo de que Jesus se refere. Basta saber se todas as mães do mundo amam os filhos das outras mães com o mesmo amor que dedicam aos seus próprios filhos.
O amor solicitado pelo Mestre vai muito além dos laços de consanguinidade, de tribos, de nacionalidades, de partidos políticos, de torcidas organizadas. Todos esses modelos de “amor” são instáveis. Nesses casos, sua pergunta tem todo cabimento.
O que o Mestre solicita de todos os que querem segui-lo é bastante difícil. Mas quem disse que seria fácil?
[1] “34Um novo
mandamento vos dou: que vos ameis uns aos outros; assim como Eu vos amei; que
dessa mesma maneira tenhais amor uns para com os outros. 35Através deste
testemunho todos reconhecerão que sois meus discípulos: se tiverdes amor uns
pelos outros.” João, 13:34-35. Bíblia King James Atualizada.
[2] Pétala, canção composta e interpretada pelo próprio autor Djavan. Belíssima canção acompanhada pelo característico som de seu violão Ovation.
[3] Idealismo. Augusto dos Anjos,
Eu e outras poesias.
O texto me despertou para uma introspecção sobre as diversas faces do dos "amores". E a esse despertar atribuo ao irmão Humberto.
ResponderExcluirGrata por dedicar tempo e delicadeza à minha questão e compartilhar tão profunda interpretação! Faz ideia de como tocou meu espírito, ora observador, cansado e deprimido?
ResponderExcluirCurti deveras o excerto a seguir:
ResponderExcluir"(...) aquele modo de amar, a que Jesus se refere, traz em si a marca da inalterabilidade. Não se altera, porque se dá no tempo, mas não pertence ao tempo. É atemporal."
Na linha do pensamento platônica, amar é mais uma prática do que um sentimento. Nesse sentido, tenho para comigo que amar é uma força inerente que clama por se manifestar.
É Lei Divina imanente na criação. Inicia-se nos átomos, pela atração, vai se desenvolvendo nos reinos da natureza e se qualifica na humanidade até atingir o refinamento nos seres crísticos que vivem-na em sua integridade.
"Amarás a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo", por hora, é ideal e, em um dia futuro, será real.