Há muito tempo acompanho o trabalho do antropólogo, sociólogo
e filósofo francês Edgar Morin – pseudônimo de Edgar Nahoum. É impressionante ver
que sua atividade intelectual não parou apesar de seus 100 anos!
Seu falar é elegante, tranquilo sem deixar de ser vigoroso e
de mexer com a estrutura a que todos nós estamos submetidos: a cultura e os
desafios do século XXI.
Defensor de uma transdisciplinaridade como forma de
transformar o mundo, é didático sem abandonar a discussão sobre a complexidade
do ser humano. Quisera eu ter essa capacidade!
Em seu livro Os Sete Saberes Necessários à Educação do
Futuro[1],
Morin utiliza o termo Homo demens para analisar esse “lado” humano em
contraposição ao Homo sapiens.
Vejamos um pouquinho do que ele diz:
Nas criações humanas há sempre uma
dupla pilotagem sapiens/demens. Demens inibiu, mas também favoreceu sapiens.
Platão já havia observado que Diké, a lei sábia, é filha de Übris, o
descomedimento. Tal furor cego destrói as colunas de um templo de servidão,
como a tomada da Bastilha e, ao contrário, tal culto da Razão nutre a
guilhotina. A possibilidade do gênio decorre de que o ser humano não é
completamente prisioneiro do real, da lógica (neocórtex), do código genético,
da cultura, da sociedade. A pesquisa, a descoberta avançam no vácuo da
incerteza e da incapacidade de decidir. O gênio brota na brecha do
incontrolável, justamente onde a loucura ronda. A criação brota da união entre
as profundezas obscuras psicoafetivas e a chama viva da consciência. Por isso,
a educação deveria mostrar e ilustrar o Destino multifacetado do humano: o
destino da espécie humana, o destino individual, o destino social, o destino
histórico, todos entrelaçados e inseparáveis. Assim, uma das vocações
essenciais da educação do futuro será o exame e o estudo da complexidade humana.
Em minha leitura, percebi que Morin propõe uma
educação multidisciplinar, transversal[2]
na qual possamos entender e desfrutar desse conhecimento para explorar essas
potencialidades e não incorrer no monoideísmo emburrecedor. [3]
Para utilizar esses dois “lados” o sapiens
e o demens em equilíbrio pelo gerenciamento da consciência amadurecida realizada
por uma boa educação.
Para nós que chegamos até aqui, é fácil verificar
que só a razão (sapiens) não nos levará ao paraíso terrestre como
ansiavam os iluministas; e nem a loucura (demens) com os seus
extremismos.
Com tudo isso, é inevitável, para mim, não
pensar no velho Buda e seu Caminho do meio[4].
Difícil? Quem disse que seria fácil?
[1] Editora Cortez,
20/02/2018.
[2] Ver também A cabeça bem-feita,
Edgar Morin. Editora Bertrand Brasil.
[3]
Monoideísmo: Estado psicológico em
que uma única ideia ou associação mental coordena, prevalece ou domina toda a
organização psíquica.
[4]
Caminho do
Meio:
um dos fundamentos do Budismo. Algo muito parecido com a concepção de virtude
por Aristóteles. Para este filósofo grego a virtude da Coragem encontra-se
entre a covardia (fugir de uma situação em que deve ser enfrentada) e a audácia
(enfrentar uma situação na qual se sabe que não há condições de êxito). Ver
Ulisses, herói lendário grego e o seu enfrentamento às sereias.
Sou adepta do método Pestalozzi o qual visa uma formação tripla:
ResponderExcluirintelectual - cabeça
moral - coração
física - mãos.