Não foram poucas as vezes em que fui convidado para falar em
centros espíritas sobre o tema “caridade”.
Nessas oportunidades não medi esforços para que as pessoas
que me ouviam sentissem um pouco do que ia no meu coração, naquele momento.
Falar com a ajuda de tecnologia, apresentações performáticas
ajudam bastante tanto o apresentador quanto o público que o ouve, mas não é
suficiente. Palestras simples, porém cheias de vida cobrem um amplo espectro de
emoções e pensamentos – finalidade, a meu ver, maior do que grandes
performances com riqueza de letras e pobreza de espírito.
Entretanto, quando um orador consegue aglutinar conhecimento
sólido com a magia da graça e da simplicidade, o alcance inegavelmente será muito
maior. Toda palestra deve provocar na audiência um tremor, um certo incômodo
positivo, uma empatia com a ideia e não com o agente da ideia; caso contrário,
o orador se moverá pela vaidade e não pelo prazer de ensinar, elucidar,
provocar, encantar.
Neste passo do meu raciocínio, lembro-me de uma passagem dos
evangelhos em que Jesus, falando, é elogiado por alguém que o ouvia. Essa
passagem está registrada no evangelho de Lucas, capítulo 11. Vamos a ela:
27Entrementes,
enquanto Jesus comunicava esses ensinos, uma mulher da multidão exclamou:
“Bem-aventurada aquela que te deu à luz, e os seios que te amamentaram!” 28Ele, porém, afirmou:
“Antes disso, mais felizes são todos aqueles que ouvem a Palavra de Deus e lhe
obedecem” (destaque meu).
Sem entrar em detalhes sobre o que seria “a palavra de Deus”,
ao ser elogiado, Jesus corrige a mulher imediatamente como um sinal de que não
deve haver espaço para tolas vaidades entre quem fala e o que fala. A
importância está na mensagem, não no mensageiro. Em outras palavras, o que mais
importa é o conteúdo e não o continente[1].
Acho curiosos os cartazes contendo as palestras de um período
e os temas pouco ou nada ligados com a atividade profissional do palestrante. Lá
estará indicado o “lattes” daquele engenheiro mecânico Ph.D. que falará,
por exemplo sobre o perdão (?!). Se este engenheiro fosse falar para um público
especializado seria necessária apresentação de seu currículo, mas num centro
espírita, com uma audiência heterogênea, que nexo há nisso? A não ser que haja
perdões entre engrenagens, polias e pistões.
Aqueles que se preocupam com “quem está falando” mais do que
com o conteúdo falado, equiparam-se àqueles que numa guerra de arcos e flechas
topam com alguém ferido por uma flechada e param para discutir o modelo da
flecha, o material de que é feita, qual a sua espessura, como foi confeccionada
ao invés de socorrer o ferido.
Difícil? Quem disse que seria fácil o desafio do Cristo aos
que o ouviam: “Se alguém deseja seguir-me, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz
e me acompanhe.”[2]
E a cesta de carnaval? O que tem a ver com a caridade e esse
blá-blá-blá?
Conto na próxima publicação.
Nota: O Blog “Espiritismo Debatido" já atingiu a marca de 12 mil visualizações. Caso você goste do que lê aqui, peço que o divulgue e indique a fonte dos textos que achar interessante compartilhar.
Sinto-me honrado com a sua visita e comentários, críticas e eventuais correções.
[1] Continente e
conteúdo: O copo que contém a água é o continente; a água contida no copo é
o conteúdo. Caso estivesse você com muita sede, o que seria mais importante o o copo ou a água; o continente ou o conteúdo?
[2]
Mateus, 16-24. Negar-se a si
mesmo pode ser entendido como evitar personalismo; importância pessoal.
Tomar a cruz para si é tomar para si a responsabilidade da
própria vida sem justificativas e condenações como numa chave estoica em
direção à imperturbabilidade necessária diante dos desafios próprios do mundo.
De início, na 'performance' de um orador lembrei-me do sermão da "Sexagésima", do padre Antonio Vieira, do qual transcrevo o seguinte excerto:
ResponderExcluir"Para uma alma se converter por meio de um sermão, há-de haver três concursos: há-de concorrer o pregador com a doutrina, persuadindo; há-de concorrer o ouvinte com o entendimento, percebendo; há-de concorrer Deus com a graça, alumiando. Para um homem se ver a si mesmo, são necessárias três coisas: olhos, espelho e luz. Se tem espelho e é cego, não se pode ver por falta de olhos; se tem espelho e olhos, e é de noite, não se pode ver por falta de luz. Logo, há mister luz, há mister espelho e há mister olhos. Que coisa é a conversão de uma alma, senão entrar um homem dentro em si e ver-se a si mesmo? Para esta vista são necessários olhos, e necessária luz e é necessário espelho. O pregador concorre com o espelho, que é a doutrina; Deus concorre com a luz, que é a graça; o homem concorre com os olhos, que é o conhecimento."
Na sequência ri à beça com os "perdões entre engrenagens"!!!
E, por fim, já são duas postagens que encerram a 'la Sherazade': "conto na próxima publicação".
Muito boas reflexões!!