Há
muitos anos, em Santo Tomás de Aquino – cidadezinha do estado de Minas Gerais,
a família Nazar me recebeu em sua casa num período de grande debilidade física
e fragmentação psicológica.
Aquele
momento de minha vida foi muito significativo, porque a forma como a família
toda me tratou, inclusive meu irmão Adilson então marido de uma filha daquele
grupo familiar fizeram com que eu recuperasse minha autoestima perdida pelos
caminhos tortuosos da vida.
O
“seu” Ary Nazar – dono da casa que me recebera – era uma pessoa especial: simples
nos modos, mas cheio de sabedoria, protagonista de histórias interessantes, às
vezes trágicas e às vezes cômicas. Com orientação claramente espírita, criara
um grupo cuja finalidade era ajudar pessoas daquele pedaço de Minas, fosse com
pão, fosse com amparo espiritual.
“Seu”
Ary mantinha um negócio de venda de produtos agrícolas, depois de muitos anos
trabalhando como caminhoneiro, por esta razão possuía, no escritório de sua loja,
uma escrivaninha com uma máquina de somar bem antiga. Por alguma razão acabou
descobrindo que eu possuía a capacidade de somar com rapidez incomum naquele
tipo máquina.
Em
sua simplicidade, “Seu” Ary pegava uma lista qualquer de números, chamava os
seus amigos para aquele “espetáculo” e se comprazia com orgulho de ver minha
capacidade de lidar com a engenhoca feita para somar e subtrair.
O
tempo passou e, em 03 de abril de 2019, o “seu” Ary se foi...
Ao
saber de sua morte, meu coração encheu-se de grande emoção, então escrevi
alguma coisa em sua homenagem em gratidão ao que fez e ao que ele foi:
Somava somava somava...
Ele
chamava toda a gente para me ver somar. E eu somava somava somava.
Enquanto
eu somava listas enormes de números, ele ria de forma inocente.
Naquele
tempo somar era o que importava. As sombras da subtração ficavam no horizonte
distante.
Mas
como dizia Rubem Alves no seu Tempus fugit, o tempo passou deixando marcas em minha pele, em minha alma.
Toda
aquela realidade – viva em minha memória – passou. Hoje não são mais as mãos
que somam, são os algoritmos. A vida ficou menos orgânica, menos ingênua, mais
mecânica, mais astuta. A inocência do riso em ver alguém somar se foi com o
tempo.
Chegou
o tempo da subtração: sim, a velhice bate à minha porta cobrando subtração. O
tio João, a tia Cesarina, Dona Dalva, a mãe Elvira, o Nenão, o Simão, o Wartão,
os Beatles, as tardes com café e pão.
Agora,
aquele que pedia para eu somar foi subtraído pela voragem do tempo.
Vai
com Deus “Seu” Ary. Mande lembranças a todos os que foram subtraídos de nós.
Daqui
a pouco serei eu subtraído de outros que ainda somam.
A saudade encontrou conforto nas suas palavras repletas de poesia.
ResponderExcluirTio querido, suas palavras mais uma vez me emocionaram muito. Ontem foi dia de festa no plano espiritual, aniversário do vovô Ary, por muito tempo nosso esteio, a luz q conduzia nossos passos, a segurança q nos abraçava com amor e proteção, agora, seu corpo de matéria se foi, mas a luz q contorna seu espírito ainda brilha perto de nós! Obrigada tio, por palavras tão abençoadas homenageando o vovô Ary.
ResponderExcluirNão conheço você pessoalmente. Mas, muito obrigado por contar esta história tão bonita do meu tio Ary. Meu coração se enche de alegria e de orgulho daquele grande homem.
ResponderExcluirO tempo nos subtrai deste plano, porém nos soma no plano espiritual.
Muita gratidão por suas palavras.
Sou a Bárbara, neta do seu Ary e foi lindo ler o que o senhor escreveu dele! Estes dias estão sendo de muitas saudades, mesmo sabendo da continuidade da vida, a ausência física dói... Obrigada por lembrar tão carinhosamente do meu vô Ary....
ResponderExcluirÀs pessoas passam pelas nossas vidas deixam um pouco de si e levam um pouco de nós. O Ary deixou muito,muitos exemplos de como ser fraterno,de caridade,desprendimento,determinação,sabedoria e amor,muito amor. Tomara que em algum momento tenha feito algo, que ele possa ter levado com ele. Tomara, para que essa saudade doa pela ausência e não pelo tempo perdido .
ResponderExcluirLindo texto! Não conheci "seu" Ary, mas pelo que li ele somou muito na vida de muitas pessoas.
ResponderExcluirE sentimos saudades daqueles que somam em nossas vidas...
Habilidade e sensibilidade para narrar um tema que nos remete à eternidade!
ResponderExcluirLindo olhar sempre, humberto! Grata pela emoção!
ResponderExcluirInteressante o acontecimento desenrolar-se numa cidade com o nome do monge filósofo Tomás de Aquino.
ResponderExcluirAlém das temporalidades aditivas e subtrativas li nas entrelinhas (e nos comentários) também as multiplicadoras e distributivas presentes nas suas relações amigáveis e familiares.
Agregue ideias, desconte espaços mentais, pluralize conhecimentos e fracione saberes sem deixar de aquilatar o amor inerente em todos esses sinais existenciais.
"Carpe diem".