
Antes, quero prestar homenagem
ao grande pensador Ubiratan Rosa que fez sua passagem ontem.
Simples sem deixar de ser
profundo, possuidor de uma rara nobreza intelectual, vasto saber difícil de
encontrar neste mundo repleto de vaidades tolas.
Morre uma grande referência
para mim.
Obrigado Ubiratan por trazer
tantas luzes a esta alma sedenta e confusa.
Descanse em paz.
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(Lendo o prefácio de A potência de existir de Michel Onfray)
*
*No prefácio deste livro, Onfray[1]
fala de sua experiência quando tinha 10 anos de idade que, em setembro de 1969,
foi deixado pela mãe no orfanato mantido por padres salesianos, em Giel,
França.
Entre as paredes daquela instituição, Onfray narra com letras
marcantes o clima de disciplina opressiva injustificada para crianças
abandonadas e, pior, acusa a instituição por manter pedófilos em seus quadros de
responsáveis.
Talvez, esta experiência explica a sua aversão à Religião e
seu ateísmo demonstrado em seu livro mais conhecido – Tratado de Ateologia.
Destaco esse trecho do A potência de existir:
Não se escapa de uma prisão não
murada. A carne e a alma são vigiadas inclusive à distância, principalmente à
distância.
Dessa leitura inicial refleti sobre o seguinte
(sendo bastante
genérico). Podemos classificar a humanidade em grupos:
1)
Aquele
que se nega a reproduzir aquela mentalidade castradora da criatividade humana
configurada num verdadeiro condicionamento psicológico retrógrado.
Geralmente, pessoas desse grupo são malvistos
pelo exercício puro e simples de questionar[2].
Não raro, tornam-se párias do status quo[3];
2)
Outro
grupo é formado por aqueles que reproduzem as regras transmitidas por gerações
sem a capacidade cognitiva para suspeitar das exigências próprias da cultura
instalada nos corações e mentes. Imitam cacoetes de seus ancestrais.
3)
Um
outro grupo destaca-se por ser bastante problemático. Pessoas desse terceiro
grupo são os que, não possuindo uma fé operante e sincera, aproveitam-se da
boa-fé de muitos para tirar proveito, saciar suas taras, destilar o seu
ressentimento; descarregar o seu ódio.
O que se vê, na passagem do tempo, é
esse grupo estimulando aqueles incapazes de refletirem sobre o mundo a agir
contra o primeiro grupo, arrastando os questionadores para o cadafalso[4]
com requintes de tortura, sangue e morte sob o clima de “festa cívica”.
Em vão trabalham para aniquilar toda
a oposição, toda a conscientização da real condição humana, porque, à revelia
desses reacionários, os avatares[5]
continuarão a “descer” na Terra com suas ideias revolucionárias opondo-se a
usos e costumes ultrapassados e carcomidos pelo tempo.
Traidores e detratores têm como
destino o círculo mais profundo do Inferno, segundo Dante Alighieri[6].
Na melhor das hipóteses terão os seus olhos costurados com arame como relata o
grande poeta florentino[7].
Como disse o poeta Mario Quintana, em
seu “Poeminho do contra:”
Todos
esses que aí estão
Atravancando
o meu caminho,
Eles
passarão...
Eu,
passarinho!
Que possamos nos livrar das cercas invisíveis do preconceito e da ignorância.
[1]
Michel Onfray é
um filósofo francês conhecido por sua posição ateia e polêmica. Autor de muitos
livros.
[2] Só para citar alguns:
Giordano Bruno; Mestre Eckhart; William de Ockham; Galileo Galilei; Johannes
Kelper; O número de pessoas classificadas como hereges é enorme. Alguns deles
foram executados.
[3] Expressão em latim que
significa “estado em que as coisas se encontram”.
[4] Palanque construído em
praça pública onde se instala a forca com o fim de executar opositores e
pessoas condenadas.
[5] Na tradição hindu,
avatares são seres evoluídos que, periodicamente, descem à para iluminar a
humanidade. Terra (em sânscrito a palavra avatara – de onde vem avatar -
quer dizer descida)
[6] Dante Alighieri é um
famoso poeta de Florença que compôs uma obra grandiosa o poema chamado “A
Comédia” – que de tão grande recebeu o título de “A Divina Comédia”.
[7] A “melhor hipótese”
considerada aqui não é a possibilidade de fuga do Inferno, mas a da condenação
ao segundo círculo do Inferno dos nove da Divina Comédia.
Amigo e irmão Humberto, li o texto como se tivesse diante de uma pintura abstrata. Sabemos que uma obra de arte, mas não compreendemos totalmente a sua essência.
ResponderExcluirCercas, muros, grades... separam e protegem.
ResponderExcluirOnde está o perigo, fora ou dentro?
A real liberdade consciencial abriga a independência e a autonomia.
Prioridade às pontes, viadutos e passarelas. Vias nas quais possam transitar diálogos, respeito e cooperação.